As crianças puseram o chapeuzinho na cabeça, tiraram fotos,
cantaram o “parabéns pra você”, e o Bruninho se preparou para cortar o bolo.
Como já é um costume antigo, todos ficaram na expectativa sobre quem seria
contemplado com o primeiro pedaço, especialmente a avó, a mãe e uma super tia
do aniversariante, que eram as candidatas mais fortes por serem as pessoas mais
presentes e importantes na vida do pequeno Bruno. Por isso mesmo ele cortou o
bolo solenemente, colocou o primeiro pedaço no pratinho com certa cerimônia,
olhou com carinho para as mulheres da sua vida, mas, meio trêmulo, e com um
sorriso novo no rosto, voltou-se para o outro lado e entregou o primeiro pedaço
do bolo para o João, o Joãozinho, um garoto que mora ali no bairro e que
conhecera o Bruninho há apenas dois meses. Subitamente, o clima de frustração e
reprovação tomou conta dos parentes, afinal, uma tradição importante fora
quebrada: o primeiro pedaço do bolo de aniversário do Bruno foi para alguém que
não pertence à família. Isso nunca aconteceu antes! É a primeira vez em 9 anos.
E agora? Quais serão os desdobramentos desse incidente? O que pode acontecer
quando se quebra uma espécie de tradição numa família, numa empresa ou na
maneira de fazer e ver as coisas?
Aproveito esta história real apenas para dizer que
aquilo que geralmente consideramos “quebra de tradição” nem sempre o é. O
Bruninho não quebrou tradição alguma naquela noite, ele apenas atualizou a
maneira de cumpri-la. O costume antigo de entregar o primeiro pedaço de bolo a
uma pessoa como forma de homenageá-la foi preservado. A única coisa que
provavelmente tenha sido ferida ou arranhada na ocasião foi o ego de pessoas
que gostariam de manter o status de sempre ganharem o primeiro pedaço do bolo
e, assim, manterem sua primazia, seu destaque, seu reconhecimento público etc. No
mesmo sentido, o que talvez tenha sido quebrado ou maculado naquela festa foi o
monopólio que alguns familiares tinham sobre os relacionamentos e os
sentimentos do Bruninho até o momento. Então importa reconhecer que o pequeno
aniversariante não quis roubar ou diminuir a importância de ninguém. Ele só
queria expressar sua gratidão e apoio ao João, o único amigo do bairro que
aceitou o convite para ir a sua festa, mesmo tendo sido convidado apenas duas
horas antes. O Bruno se sentiu honrado com a presença do novo amigo e decidiu
retribuir honra com honra. Faz sentido! Pois mesmo sem ser da família, e jamais
imaginando ganhar o primeiro pedaço do bolo, o Joãozinho tava lá.
Em poucas palavras, o Bruno não quebrou nem desprezou a
tradição, pelo contrário, ele a cumpriu, inovou e ampliou. O Bruninho não
quebrou relacionamentos, ele acrescentou e fortaleceu laços, incluindo agora a
comunidade onde mora, representada pelo Joãozinho. Houve amadurecimento, novas
perspectivas, novos horizontes, novo sorriso no rosto, novas pessoas presentes
e importantes em sua vida etc. Mas nem todo mundo gosta disso!
Infelizmente, é assim que costuma nascer o ciúme, a
inveja e a frustração quando alguém atualiza uma tradição inovando costumes
numa família, numa empresa ou em outro contexto. Isso pode estar acontecendo
com você nestes dias: Ou pessoas estão te censurando e retaliando porque você “deu
o primeiro pedaço do bolo” de maneira inovadora. Ou você pode estar muito
incomodado e até enciumado porque o primeiro pedaço do bolo, a honra e o
reconhecimento público não pertencem mais somente a você e a sua patota. Pense
nisso! E lembre que muita gente merece o primeiro pedaço do bolo e que, de
qualquer forma, tem bolo pra todo mundo. (Desconsidere os casos em que o
primeiro pedaço de bolo é dado a alguém por mera puxação de saco, demagogia, vingança,
politicagem, hipocrisia etc).
Muito bom! Gostei.
ResponderExcluirParabéns pelo texto. Ele nos mostra uma realidade que não queremos enxergar no nosso dia a dia no trato com as pessoas.
Abraço.